terça-feira, 22 de dezembro de 2009

A MÚSICA TAMBÉM ESTÁ MORRENDO

Há alguns meses morreu Michael Jackson. Todos acompanharam isso pela televisão. Ele era único. Tinha realmente muito talento, era ótimo como cantor, como compositor, dançarino, além de tantas outras qualidades. Ele era um gênio. Reinventou o vídeo clip, criando mega produções que estavam no nível de sua qualidade musical.
Apesar da vontade de prestar um tributo a Michael, não é sobre ele que vou falar, mas será uma espécie de desabafo devido a algo que ouvi de alguns de meus alunos no dia seguinte ao de sua morte. Vou situá-los. Costumo dar aulas para alunos de todas as séries, desde a quinta série do ensino fundamental, até o terceiro ano do ensino médio, inclusive para EJA. No dia seguinte à morte de Michael Jackson dei aulas para as oitavas séries do ensino fundamental, é lógico que comentários sobre a morte dele apareceram, inclusive a frase: “Não estou nem aí se ele morreu, eu não gostava dele mesmo”. Esse comentário foi seguido por várias vozes que concordaram.
Eram alunos entre 13 ou 14 anos, eles não viveram os anos oitenta, não conheceram a música de Michael Jackson quando este ainda estava no auge, só conheceram os “escândalos” que não foram provados. Mas o comentário supra citado me deixou com receio ou até mesmo medo de imaginar para onde caminha a música de boa qualidade.
Não é pelo fato de eles não gostarem da música do Michael Jackson, cada um deve ter seu próprio gosto pela música. Theodor Adorno, se tivesse ouvido as músicas dele também odiaria. Mas oque me assusta é o fato de essas crianças e adolescentes de hoje não gostarem de Michael Jackson e adorarem coisas que não podem ser consideradas músicas, como por exemplo os diversos cantores de funk carioca e as tais duplas sertanejas atuais, que de sertaneja não tem absolutamente nada. Eles adoram essas “músicas” pré frabricadas com o único intuito de gerar dinheiro. São músicas completamente sem criatividade. Todas iguais, com rifs idiotas e letras fáceis de se compreender para que agrade a massa. Em geral, se não fala de sexo, fala de “amor”, que na realidade não passa de dramalhões dignos de novelas mexicanas. Quero ver se algum deles tem a capacidade de falar de amor como Álvares de Azevedo falava.
A música hoje não passa de mercadoria. Algo para se consumir e jogar fora. Segundo o filósofo Theodor Adorno “a produção musical avançada se independentizou do consumo. O resto da música séria é submetido à lei do consumo, pelo preço de seu conteúdo. Ouve-se tal música séria como se consome uma mercadoria adquirida no mercado. Carecem totalmente de significado real as distinções entre a audição da música “clássica” oficial e da música ligeira”.
Salvo os grandes “dinossauros” da música, que em breve terão o mesmo fim de Michael Jackson, não existem mais artistas que serão lembrados por sua obra. Ainda hoje temos Rolling Stones, Paul MacCartney (remanescente dos Beatles), BB King, Eric Clapton, Aretha Franklin, mas são poucos. A maioria já passou desta para melhor como Jimi Hendrix, John Lennon, James Brown, o próprio Michael Jackson...Isso sem contar os inúmeros músicos brasileiros que estão na mesma situação. E mesmo, muitos deles, tendo feito musica comercial, há um grande diferencial em relação à músicas de hoje: A qualidade. Mesmo músicas simplórias em sua melodia, como o punk rock do Ramones, tem o seu diferencial: atitude. Música propositalmente despretenciosa, com o único objetivo levar seus ouvintes a pensar devido a suas letras engajadas, ou apenas de fazer música porque seus autores gostam de música, e não apenas para criar um novo hit que renderá milhões. Cito pela segunda vez Theodor Adorno: “Não somente o ouvido do povo está tão inundado com a música ligeira que a outra música lhe chega apenas como a considerada “clássica”, oposta àquela; não somente os sons onipresentes de dança tornam tão obtusa a capacidade perceptiva que a concentração de uma audição responsável é impossível; mas a sacrossanta música tradicional se converteu, pelo caráter de sua execução e pela própria vida dos ouvintes, em algo idêntico à produção comercial em massa e nem sequer sua substância permanece sem se contaminar”.
Bandas como Simple Plan, Britney Spears, os tais Jonas Brothers, que recentemente estiveram no Brasil, são passageiras. É algo, que os mesmo seus mais ávidos fãs esquecerão, tão logo apareça uma nova modinha para que eles idolatrem. (Nesse momento peço encarecidamente que vocês ouçam a música “a melhor banda de todos os tempos da última semana” dos Titãs, pois se eu colocar a letra, o artigo ficara muito extenso). Essa música resume isso. Aqui coloco a terceira e última citação de Theodor Adorno nesse artigo: “O modo de comportamento perceptivo, através do qual se prepara o esquecer e o rápido recordar da música de massas, é a desconcentração. Se os produtos, normalizados e irremediavelmente semelhantes entre si exceto certas particularidades surpreendentes, não permitem uma audição concentrada sem se tornarem insuportáveis para os ouvintes, estes, por sua vez, já não são absolutamente capazes de uma audição concentrada. Não conseguem manter a tensão de uma concentração atenta, e por isso se entregam resignadamente àquilo que acontece e flui acima deles, e com o qual fazem amizade somente porque já o ouvem sem atenção excessiva”.
Triste ver que está surgindo uma geração que não sabe o que é música. Para eles, se o cantor é lindo ou se a cantora é gostosa já basta. Estive há algumas semanas no Show do Sérgio Reis (sim, é sério) e pude presenciar o que é música sertaneja de verdade. Letras que falam de adoção, amores verdadeiros, amizades, natureza, e mesmo as músicas que tinham o objetivo de irreverência, foram compostas com criatividade e humor de verdade sem ser esculaxado, idiota e sexista. E tudo isso vindo de um canto só. Não pude deixar de comparar com as duplas sertanejas atuais que não conseguem compor nada de original. Suas músicas são baseadas em mulheres que trocam o protagonista por outro (dor de corno), piadas idiotas sobre sexo, e bebedeiras. Não conseguem fazer nada além disso. Mas o pior é o motivo pelo qual eles fazem sucesso: o povo acostumou com porcaria auditiva. É tanta porcaria despejada nos ouvidos que passa-se a mpressão de que só aquilo é música. Vi muitos de meus alunos no show do Sérgio Reis, óbvio que eles não conheciam nada desse artista, mas não se interessarem por sertanejo de verdade e curtirem o “sertanejo universitário” é cruel! Aliás, vou fazer uma observação um pouco fora do tema. Tudo começou com o tal forró universitário, até é justo o tema, visto que surgiu de uma mistura de forró “pé de serra” com outros estilos, dentro de universidades. Mas PAGODE UNIVERSITÁRIO E SERTANEJO UNIVERSITÁRIO NÃO EXISTEM! É uma forma de fazer esses dois “estilos de música” aparentarem ser algo intelectual, já que sempre foram ligados a pessoas com baixo nível de instrução (inclusive os músicos), além disso, nada mais é do que o re-lançamento de duas coisas que não rendiam mais dinheiro, muda-se apenas o nome do estilo e as pessoas acham que é algo novo e voltam a consumir. O mesmo acontece, por exemplo, com grupos como Os Demônios da Garoa, Originais do Samba, o sambista Cartola...são completamente ignorados para dar lugar a grupos de pagode que tendo 10 integrantes não conseguem fazer o que Cartola fazia sozinho. Realmente triste.
Acho que é por isso que ando redescobrindo o velho. Recentemente ouvi uma banda, que eu julgava ser nova, fiquei até feliz, pensando que a música tinha salvação, mas pesquisando as origens da banda, descobri que existem desde 1994, ou seja, não são tão novos assim, eu é que nunca tinha ouvido.
A música está morrendo sim. Não há nada de novo que seja verdadeiro. Tudo que se faz é visando o lucro e apenas o lucro. Músicos devem sim, ganhar muito dinheiro, desde que sejam músicos de verdade, que façam valer cada centavo do ingresso do show e dos discos vendidos. Eles precisam saber que quem faz o sucesso deles são os fãs e não os donos de gravadoras, por causa disso que muitos caem no esquecimento tão rapidamente. As poucas coisas boas que se faz atualmente, tanto no Brasil, quanto no mundo, não são reconhecidas como arte. Infelizmente a arte de verdade passou a ser considerada pela maioria como lixo e o lixo foi elevado à categoria de arte, mas não é arte verdadeira, é enganação, pois se uma pessoa embrulhar um monte de fezes em uma caixa linda isso não vai fazer o conteúdo deixar de ser fezes.
Gostaria muito que as coisas mudassem. Gostaria que as pessoas valorizassem os músicos pelas suas qualidades artísticas e não porque é o que está na moda. Precisamos de músicas atemporais, que não sejam efêmeras, que não desapareçam no tempo. Quem dera a música de hoje conseguisse transpor séculos como Mozard, Ravel, Beethoven, Vivaldi, entre outros fizeram. Talvez uns poucos artistas contemporâneos consegam, digo talvez porque a música está morrendo. Até mesmo os clássicos/ eruditos serão esquecidos. O que será da música daqui a três gerações? O que restará de autêntico e inteligente? Acho que não vou querer saber.

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